quarta-feira, 31 de outubro de 2012

RUMAR

Rumar

Embora o que mais ame no amar,
seja o seu poder de nos resignar,
eu me perco no mistério da hora seguinte
e por conseguinte, por que há tantos empecilhos
às nossas vontades, mesmo quando elas
não só a nós dizem respeito.
Já que o amor é tão recíproco!

É para mim, uma luta constante
entre a força e a resistência –
- creio que uma seja a própria
e a outra a alheia.
A alheia por ser intocável
nem precisa se defender.
Damos socos no nada.

A própria vive de nossas próprias limitações.
Sinto teu coração repleto de amor,
e de necessidades de mim.
Vejo-me assim também da mesma forma,
cada um de um lado do oceano
a remar em pensamentos
nossos barcos a velas e sem ventos.

Tenho medo de que de remar, nos cansemos,
temo encontrar-te morta no meio deste mar imenso
já inerte e sem forças... Quanto a mim,
eu também não sei... Há momentos em que o sol
queima tanto, que até me esqueço da esperança.
Mas, amar-te é tão bom, e por isso:
Rumar, remar ao amar é preciso, preciso...

ZéReys - poeta do profundo.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

SEM DEFESAS

Sem defesas

Minha saudade é tão traiçoeira...
Preenche todos os espaços entre as nossas palavras.
Ocupa cada fresta de nosso abraço.
Tira de meu estomago, a fome.
Estica os segundos e os abraçam às horas.
... Torna o meu dia interminável!

Cega-me os olhos, para que eu não veja o sol se por.
E a noite, vira escuridão, para esconder meu sono.
No meu sentido, é um pandeiro, a sambar fremente.
Em minhas mãos, as linhas, viram traços de teu corpo.
Em tua imagem ela pinta-te multicores;
Assim, os meus reflexos são tuas silhuetas em quaisquer tons.

Não há direções em que eu não te lembre.
Não há visão em que ela não te coloque...
É tão traiçoeira esta minha saudade...
Nem me dá tempo de esquecê-la, e só para eu viver
dela e à tua mercê:  Sou só saudade,
me viro saudade...Quase sou elas!

ZéReys - poeta do profundo.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

NO DELEITE DO PÓS

No deleite do pós

Quando tu choras comigo,
ambos infestados de amor,
naqueles momentos sublimes
em que nossas almas se encontram.
Sabemos de fato o que é felicidades!

Por que não há em nós
uma mecânica quântica,
uma soma ou divisão de sentimentos
premeditados, não há, um mecanismo
puramente humano emanado.

Quando choramos, espontâneos,
lágrimas de risos, traduzindo nossas estases,
materializando deleites em gargalhadas
molhadas, e meus dedos em teu umbigo brincam
como lábios em bordas de cálices... Sou embebedado!

É um “pós” diáfano, que juraríamos eternidade,
mas, não é humano, e por isso não se atem
às nossas vontades, haveremos de esperar
um novo dia, que será único...
E repleto de verdades.

Misturam-se as dores do gozo -
 - as minhas e as tuas -, numa lânguida
e enternecida perda de chão, sem praças ou ruas,
camas, cobertores, tetos, imensidão!
 ... Um parto de ternuras e sabores que se arranca dos ventres...

ZéReys - poeta do profundo.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

















Eu hoje

Quero:
depois
de o dia
passar,
ser apenas
o teu homem
noite adentro.
Seu clique
de luar
para se clarear,
quando a tua luz
se acender
no teto,
perto
de meu peito,
peito adentro,
teu unguento
para te curar.
Quero ser
teu homem
para te deixar levar,
e me levar...
Deixar lavar
as nossas almas...
Nas águas do suor
De nosso amar.
Hoje, quero:
Depois de o dia passar,
noite adentro,
ser o teu rebento,
ser teu homem
sem chorar...
Hoje eu quero!

ZéReys – poeta do profundo

sábado, 20 de outubro de 2012

SER OASIS

Ser Oásis

Oro-te ó mulher que amo:
Teus cálices de mãos,
Dedos e vinhos, cores do álamo,
leves painas... Algodão.

Como respirar-se pétalas
abraçado às brisas,
nuvens alvas no clarão.
Afagar a ternura da paz ao chão...

Fechar os olhos, sentir o som,
afagar a cor da alma...
ter a inevitável visão.
... Se perder na imensidão.

Deitar-se na candura
explicitada do deleite,
ao calor do azeite e
desejos em profusão.

Deixar e sentir o amor escorrer,
por teus seios e umbigo, comigo.
Ouvir ouvidos e sentidos,
seguir meandros e boca e risos...

Doce dor, adorar a dor... Enternecer.
Amar o prazer da doçura,
a mistura, o lamber da uva,
o cheiro da vulva... O amor!

E depois ver vir dos céus,
a essência divina dos céus...
A diluição dos éteres... Mel.
Hálito de Deus, nas bocas!

Ó mulher que amo,
quero-te tanto amar assim.
Dê-me tuas mãos em conchas
Teus dedos em caules... Por mim.

Dê-me ó mulher, por ti,
por nós, o sim... Retire teu véu;
e por nosso céu, teu amor...
Pelo amor de Deus...

ZéReys - poeta do profundo.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

NÃO HÁ MAIS TEMPO

Não há mais tempo

O quanto existe além do palpável é imensidão.
A dor, a saudade, a onipresença, o próprio amor,
nossa vontade, a nossa alma, a fé, a crença na esperança;
que também é invisível – o místico do coração.

Palavras são impalpáveis, assim como os sons, assim como
O sentir e o vento e a emoção; o que nos faltam: não vemos;
Nem o que almejamos nem o sono ou o sonho,
E mesmo o que somos - de fato - não somos.

O que somos e vivemos então, se não, a soma dos improváveis,
O divisor dos impossíveis, o multiplicador dos invisíveis,
A junção do nada, a materialidade do milagre, a prova de tudo,
Com toda esta carga de invisíveis, agindo em nós... Ágeis!
  
A vida... Tão frágil, o amor, tão grácil, efêmero, diáfano e eterno,
Como o invisível sentimento de existir, de ser feliz, de amar.
E assim, perdidos neste tempo, que invisivelmente passa,
Iludimo-nos, que ainda haverá outro agora, para sermos felizes!


sábado, 13 de outubro de 2012

MADALENA E O SEMIDEUS (UMA HISTÓRIA DE AMOR)

Madalena e o Semideus
(Uma historia de amor)
1 -
Jesus morava de um lado da rua e ela do outro, só que de frente da casa de Jesus havia um quintal imenso, (naquela época, mesmo nas casas de gente paupérrima se jogava comida fora, como prova de fartura, e os terrenos não fugiam às regras - eram grandes) e, como tudo era exagerado, aquele quintal baldio parecia mais um sitio lá no Japão.  
2-
Madalena morava pegada a este quintal imenso e os fundos de sua casa, eram cercados por uma tela de arame, como se fosse uma rede de travas de futebol - para divisar os terrenos - ali, os pintos passavam pelos buracos e as galinhas ficavam piando do outro lado. De vez em quando, elas socavam suas cabeças avermelhadas - com cara de membro sexual masculino - e danavam a piar para chamar seus pintos que acabavam se afastando de suas gloriosas mães.
3 -
Madalena era uma mulata fogosa e de corpo estrutural, tinha vinte e seis anos e era daquelas que nem o diabo podia. Sempre que se inventava alguma festa lá estava ela se sacolejando toda, qual uma cobra no asfalto quente. Enquanto que Jesus a espiava de longe, com cara de menino maroto. Na verdade, Madalena nem o notava sempre que estava em seu doce mundo da gandaia.
4 -
Jesus era um menino ingênuo e tímido, exceto quando ele bebia vinho na festa de Cosme e Damião promovido pelo centro espírita – Luz do céu.
Era danado, ele, sabia onde o povo escondia o garrafão e, escondido ia lá com uma caneca e entornava uma boa talagada e enchia a caveira dando uma golada de quase sair pelas narinas, ficando meio grogue logo em seguida, ai sim, ele se desvencilhava da timidez e partia para mexer com as garotas.
 5 -
Porém, por Jesus ser absurdamente feio e raquítico - como se fosse um daqueles ratos de deserto do filme de Ali babá -, com seus cabelos compridos, unhas sujas, e roupas rotas com seu pobre e pequeno pinto a toda hora saindo pelo buraco do pano da calça - como se fossem os das galinhas vazando as telas - sem que vise, nem as meninas ou Madalena chegavam perto dele. Por esse e outros fatos, o próprio menino queria até ser crucificado - devido tanta rejeição. O que talvez o salvasse de um suicídio, era que por ser virgem vivia sonhando em estar com Madalena naquele quintal imenso cheio de mamoneiras.
6 - 
Madalena era uma mulher formada, adulta e adultera. Seu marido ou amante – ninguém entendia aquele “rolo” dela – pois, só se via o camarada por ali, umas três ou quatro vezes por ano e isso, inclusive, fazia com que alguns dissessem que ela recebia pelos correios o dinheiro que ele lhe mandava para pagar suas despesas - mas como nem só de pão viverá o homem - alguém também já havia dito isso -, Madalena com todo aquele fogo na sarça, e, para não ser chamada de prostituta, fazia questão de nunca cobrar pelos seus desprendimentos benévolos, sem contar que ela adorava ser iniciadora dos meninos desvalidos – há de se entender que nesta época, prostitutas eram presas e tratadas a pauladas ou eram apedrejadas em vias públicas, quando não as duas coisas.
 7 -
Embora não fosse ela exatamente uma prostituta, mas uma benfeitora dos garotos desvalidos – se é que me entendem – às vezes ela exagerava, principalmente quando tomava uns goles de vinho do boteco do Tadeco e depois ia para algumas das festas e dançava fazendo trejeitos considerados obscenos por alguns, e assim, um dia desses, foi só uma pessoa tomar coragem para começar a gritar que todos gritaram também.
- Joga merda na Madá , joga pedra na Madá, ela é feita pra apanhar,
ela gosta é de dá e nunca quer parar.
 8 -
Mas, quem estava ali só espiando todo aquele bafafá? Isso mesmo, o menino Jesus no limiar de seus treze anos com a cara surgindo sua décima quinta espinha. E como a festa acontecia logo na esquina de sua casa, ele correu rapidamente a casa e pegou uma foice de seu pai, e se atirou na frente da pobre mulher e disse:
- Quem ousar a atirar a primeira pedra terá dobrado os seus pecados, porque eu lhe corto os sacos! Então só se via o povo se espalhando diante da fera que este pequeno menino se tornou. Parecia até um santo tomado de ódio a expulsar jogadores de dados em templos sagrados.
 9 -
Ele e Madalena rapidamente se foram em meios ainda a gritos de algumas pessoas ao longe, Madalena estava desorientada e quando ia entrando em sua casa, se voltou rapidamente porque se lembrou que devia agradecê-lo e lhe deu um beijo no rosto. Jesus que não esperava o carinho, nem teve chance de retribuir o agradecimento, mas para não perder a excitação, saiu apressado com toda aquela adrenalina. E ela se foi entrando correndo em casa e se jogando chorando na cama, adormeceu.
 10 -
Jesus, ao chegar a sua casa procurou guardar a foice sem que ninguém o visse, aliás, seu pai tinha muitas ferramentas de carpintaria, ele era muito bom na arte de fazer telhados com aqueles desenhos chamados de rabo de andorinhas. Muitas pessoas o procuravam para este trabalho, e ele, em especial morria de ciúmes desta foicinha que lhe fora dado por seu pai, avô de Jesus, há quase cinqüenta anos.
11 -
Já havia horas que o dia tinha amanhecido e Jesus assuntava pela Madalena e nada de vê-la. Ele já tinha ido as espreitas pela mamonal ver se a via. Mas Madalena poderia estar ainda dormindo, ou se escondia devido à vergonha do dia anterior. Enquanto isso, Jesus estava em pé escorado no mourão da cerca de sua velha casa e como alguns garotos brincavam de rodar piões na rua, ele os observavam e acabou por nem dar por fé que Madalena, lá da porta de sua cozinha o via, o observava, ali quieto.
12 -
Madalena, então, para chamar a sua atenção sem que ninguém notasse que era especialmente para ele, deu um assovio a esmo, colocando um dedo de cada mão no lado oposto do canto da sua boca e trinou o apito, alto, forte, logo ele levantou a cabeça e notou sua presença em pé na porta da cozinha. Olharam-se, ele e ela, por um instante e ela o acenou com a mão dando lhe um sinal de que devia ter com ela. Jesus então saiu dali como se olhasse para as cores das nuvens e disfarçando-se, sem que nenhum dos garotos o visse entrou pelo mamonal adentro.
13 -
Quando ele chegou junto da tela de arame, que divisava os terrenos dela e do mamonal, lá estava ela com uma caneca na mão. De dentro da vasilha, saia uma fumaça esbranquiçada do calor do leite com chocolate.
- Tome, fiz pra você! – disse esticando os braços longos, para passar por cima da grade de tela que os separavam. Jesus fez o mesmo e apanhou a caneca, depois deu uma assoprada e bebericou um gole.
-Ui... Está muito bom isso!
- Você gostou... Meu herói!
- Por causa de ontem? Perguntou, como se já soubesse a resposta, Jesus.
-Sim, meu bem, é claro!
- Ah... Foi nada! Não podia deixar aqueles bestas lhe matar...
- Fiquei muito sensibilizada com sua atitude de macho salvador...
- Ficou o quê?
- Feliz de te ver ali armado em minha frente pronto pra enfrentar aquela gente louca, onde já se viu... Bando de alucinados! Jesus a olhou sem entender direito suas palavras, enquanto tomava mais uma golada daquela delícia rara para ele. Ele era um menino bom e diferente, suas atitudes não eram tomadas racionalmente, mas por pura bondade, inerente.
14 -
Jesus acabou de tomar o leite com chocolate quente e levantou seu braço para devolver-lhe a caneca, e nesse momento, foi que ela, propositalmente segurou sua mão que segurava a vasilha, e com a outra mão pegou a outra mão dele; de modo que ele ficou seguro pelas mãos dela. Ela o olhou bem dentro de seus olhos, e Jesus então compreendeu, através do desejo que sentiu, que ela o estava seduzindo. Ela então foi se abaixando, e à medida que assim procedia, ele a acompanhava até que ambos ficassem totalmente rentes ao chão. Jesus tinha agora sua face totalmente avermelhada, pelo fogo que lhe subia e que lhe parecia vir de sua alma boa e condolente.
15 -
Madalena era uma mulher adulta – como já disse anteriormente -, e Jesus ainda um garoto, cuja sexualidade estava na flor da ascensão, porém, o que lhe estava acontecendo, era maravilhoso, divino, delicioso. Aquela sensação de regozijo lhe esparramava por todo o corpo, lhe dando uma leveza de espírito tal, que sentia que aquele prazer lhe daria a mesma sensação de viajar sobre nuvens e se esconder atrás das estrelas para brincar com alguns anjos
16 -
Madalena, sabiamente, arrastou as mãos dele até suas cochas e pode sentir elas tremularem sobre sua pele morena. Sentiu seus tremores como se fossem carícias a lhe escorrer para seus púbis. Fechou os olhos e ofereceu a Jesus, como se seu lábios fosse um cálice cheio de um vinho derramado pelos céus em suas bocas, e ele como a um santo, não os recusou, e sentiu-se assim, pela primeira vez, o que seria ser realmente humano. O que seria, de acordo como entendeu, o melhor prazer que teu Pai do céu, lhe dava como prova de todo o seu sacrifício de vida. O melhor dos prazeres!
17 -
Estavam agora em uma estase total, e simultaneamente, eles se achegavam para juntos, um do outro e da tela de arame que separavam seus corpos. Havia um respirar ofegante como se fossem os pobres pintinhos atravessando as frestas triangulares da tela: não eram; eram de verdades seus hálitos se misturando e se misturando, como se fossem ambos, espectral. Ela, já estava preparadamente sem suas calcinhas, e por baixo daquele vestido rodado, onde buscavam as mãos de Jesus sua melhor intimidade, um calor intenso penetrava em seus dedos...
18 -
Ela o arrastava contra a tela fria, ele a seguia e se impulsionava buscando chegar mais próximo dela e assim, ele se espremia contra a tela e ela se espremia contra ele. Suas bocas sangravam, sem que notassem por que o arame da tela, devido o frenesi os machucavam. Seu sangue misturou-es com o dela. De seus olhos, escorria dois pares de lágrimas e se misturavam entre os arames e as folhas das mamoneiras, por que naquele exato momento em que ambos saciavam-se, começava uma chuva fina sob um sol forte que brilhava intensamente, transformando todas as gotas de chuva em pingos de ouro, escorridos pelas folhas das mamoneiras e caindo em seus rostos suados...
19-
E foi assim, que Jesus, recebeu de Madalena, seu primeiro batismo de ser homem, tornando-o um ser humano, e, herói. Aquele que poderia ser o que quisesse ser, até mesmo um deus, por que um homem que descobre o prazer de ser homem poderá ser tudo, que quaisquer deuses ou deusa o tenham dado!
Fim.

O trabalho MADALENA E O SEMIDEUS - CONTO - deZéReys - poeta do profundo foi licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição - CompartilhaIgual 3.0 Não Adaptada.
Com base no trabalho disponível em
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quarta-feira, 10 de outubro de 2012

ELO MÍSTICO


Elo místico

O meu tempo de viver escorre.
E há tantos entres dedos e fios de cabelos e pele,
como veios para que flua livre como um rio.
E a minha liberdade de viver está presa.

Mas o meu tempo de viver é tão livre e breve,
que nem se há tempo para que eu te alcance.
Eu estou preso nas circunstâncias alheias.
Eu me seguro no vento com a mão do firmamento.

Eu estou fixado neste elo de particularidade do mistério
De que existir não seja uma questão de conveniência.
Eu mal mando em minha sobrevivência.
E, não há em meios a este emaranhado, minha opção.

O tempo, aliado a questão alheia da circunstância,
é tão altivo e egoísta, que me deixa chorar por ela,
sem que ao menos ouça meu choro – tolo sou eu.
Se bem que há um grande amor que me preserva.

E se amar, não dependesse tanto do tempo,
das circunstâncias, do destino, da sorte, dos sonhos,
das decepções... Estaria contigo. E esquecido de tudo,
nem ouviríamos o gemido da história.

ZéReys - poeta do profundo.


segunda-feira, 8 de outubro de 2012

GERALDO, A MULHER E FERNÃO - CONTO.


Geraldo, a mulher e Fernão

Um dia, eu conheci uma pessoa assim:
Ela amava tão intensamente e tão entusiasticamente, mas o seu ciúme suplantava este amor que ela sentia tão fortemente... Aparentemente ela amava muito. Ele (seu ciúme) mandava nela e ela tentava mandar em seu homem, de tal maneira tão inconsequente, que o oprimia involuntariamente, já que no fundo, ela também sofria muito.

Eu ficava intrigado, porque embora fosse tão veemente sua vontade de prender o seu amado, ela vivia o paradoxo de sua própria liberdade, como se ela fosse um carcereiro de seu amor e seu amor um prisioneiro de seu ciúme. Isto, inclusive, sem admitir sua liberdade cerceada na mesma proporção.

Depois das conjecturas imaginativas com farturas de coisas inexistentes, ela chorava desesperada e lhe pedia perdão com a mesma veemência com que o julgava e o condenava, bem antes até de que ele soubesse a causa.
Depois das brigas, ela o seduzia como uma víbora e fazia amor intenso, como forma de demonstrar seu amor e sua paixão aloucada. Era uma fera alucinada, naqueles cavalgares de posições e lugares. Suas fantasias eram infindas.

- Eu me lembro até de um tempo, em que certos homens, diziam: “O homem não precisa saber por que está batendo; porque a mulher saberá bem por que está apanhando!” Era um pensamento estranhamente machista de homens ciumentos que queriam – à força do medo - ter fidelidade absoluta, e jamais perder aquela mulher que “diziam que amavam” Ela não era o homem que batia ou que apanhava, mas era a mulher que o sufocava, com seus ciúmes na mesma proporção violenta com que aqueles homens praticavam seus medos da perda.

O meu amigo, que me confidenciava esta sua situação, já havia sido casado, e me dissera ele, que a sua primeira mulher era uma “mosca morta” então, talvez por isso, esta fera felina, que o feria e o amava e o enciumava tanto, como se ela fosse uma adolescente - marinheira de primeira ida - o deixava enlouquecido, sofrido, e ambos apaixonados, ao mesmo tempo.

Ela era linda e de belas coxas, que sempre - como se buscasse nele o mesmo teor de ciúmes, pois considerava ser amor, este sentimento opressor - deixava meio que à mostras essas suas partes convidativas, de formas provocativas. Mas como ela o enciumava em demasia, e lhe sugava todas as forças naquele seu amar intenso e seguido, ele não a enciumava, na verdade, ele nem notava sua carência em ser notada e também enciumada. Vivia absolutamente saciado, talvez nem em seus momentos íntimos, ele as visse, como ela gostaria.

Mas ela, por aquele sentimento opressor, pensava que ele não a amava tanto, como ela merecia, pois além de não perceber os ciúmes dele, ainda lhe parecia sempre estar na carência de saciar-se completamente. Seria ela daquelas mulheres insaciáveis, que ouvimos falar? O pobre homem era engolido para não ser homem, mas ai dele se se recusasse a ser. Isso era como um grilo grilando em minha cabeça. Além do quê, sempre que ela queria aprontar alguma, ela atacava de ciúmes só para virar a cara e o deixar com cara de culpado.

Certo dia eu acordei no meio da noite e olhei para minha companheira por alguns instantes, vi que ela dormia profundamente; levantei-me e dei por mim reparando uma moldura de sombra refletida na parede branca da sala, algo estranho formava-se com a sombra, uma silhueta mística, cuja mistura branca com mancha meio escurecida, vindo da cortina da janela da sala, moldava aquelas coxas bem feitas, lisas e bonitas, desta referida mulher de meu amigo.

- Meu Deus... O que é isso?  Perguntei-me, quase em silêncio. Ainda observando aquela imagem confusa refletida na parede, fui e voltei algumas vezes até a porta do quarto para tentar voltar a dormir, e acabei por ficar ali olhando para a sombra, por não sei quanto tempo.
- Será que as confidências de Geraldo estão me aguçando esta visão? – pensei sem acreditar muito e ainda me sentir confuso. Tentei deixar de lado aquilo e ir dormir, o que foi impossível. Não consegui!

Rolei na cama até de manhã sem conseguir adormecer novamente, depois me levantei e sem querer ou designar meus passos, me vi caminhando ao encontro de Geraldo.
- Bom, dia! Eu disse fingindo entusiasmado a ele. Embora eu também não tivesse dormido bem.
- Bom dia! Disse-me ele com cara de sono e abatido, como alguém que havia trabalhado a noite toda embaixo de chibata.

- Amigo, acho que vou ter que procurar ajuda! – me disse Geraldo, sabendo que eu o entenderia e saberia do que me falava.
- Ora amigo, sabe que pode contar comigo! – Exclamei involuntário sem perceber que estava sendo oportunista e que daquela conversa, eu poderia lucrar alguma coisa. Na verdade eu nem dei por fé sobre a coincidência do acaso. 
- Mas o que você poderia fazer para me ajudar, sem provocar a fera contra mim. – De antemão já me perpassou uma porção de coisas na mente,  mas consegui me conter e dizer a ele que me aguardasse, pois precisaria de um tempo para achar algo conveniente.

Eu tinha uma loja de eletrônicos e meu amigo Geraldo, trabalhava em outro seguimento. Despedimos-nos e eu fui para o meu trabalho, e na minha loja, eu me sentia excitado com aquela ideia de poder estar perto daquela mulher atraente e sentir aquele perfume, que de longe eu já gostava de sentir, e que também de tanto ele me contar seus arroubos, eu ficava entre o medo e a curiosidade de ouvir sua fala e algum trejeito que por acaso me faria desprender da timidez e acabar lhe dizendo algum desejo recôndito. Não sei, mas talvez no fundo, eu sentisse um pouco de inveja dele. Mas, e se ela tiver um surto e me bater nas faces, ou me xingar e contar ao Geraldo.
- Além de tudo vou perder o amigo! – refleti falando comigo mesmo, acompanhado, talvez, de algum anjo moralista.

No dia seguinte evitei falar com o Geraldo e mudei de caminho para não encontrá-lo, mas por volta das dez horas, percebi alguém chegar a minha loja e dei de cara com a mulher do amigo, confesso que fiquei sem fala por alguns segundos e a olhei nos olhos castanhos profundos sem dizer nenhuma palavra, então ela me disse:
- O senhor poderia ir a minha casa para ver nosso televisor, parou de funcionar ontem à noite! E, se calou esperando minha resposta. Dentro de um silêncio de alguns segundos, eu lhe respondi dizendo que sim eu poderia ir.

Ela se virou para sair e eu fiquei a olhar teus quadris, como se estivesse sendo puxado por eles, só depois de alguns minutos quando já estava recomposto do susto, pude juntar minhas ferramentas e colocá-las em uma maleta e sair para atendê-la. Quando eu cheguei lá ela veio me receber e tinha um sorriso meio escondido e entre dentes, como se arquitetasse alguma molecagem, como aquelas crianças peraltas, (que todos nós, conhecemos).

Em pé na porta, a espera do comando dela, por um instante, enquanto ela vinha em minha direção, fiquei. Assustei-me, entretanto, quando ela esticou sua mão e me pegou pelo braço dizendo-me:
- Sente-se, por favor... Estava com a cabeça abaixada quando eu a olhei fitando-a sem esperar que me retribuísse. Mas ela, como se sentisse, me retornou o olhar repentinamente, e foi me dizendo:
- Meu marido me disse que esteve conversando com o senhor sobre meu relacionamento com ele... Ele se queixou de alguma coisa em especial?  Ele me disse que confia muito no senhor, e, isso é muito!
- Não, sim... Gaguejei. Ele me disse que a senhora é muito ciumenta e muito ávida!
- Ávida... Ele disse que eu era ávida?  É... Acho que ávida está bom, sou ávida pelo amor, o senhor me entende?
- Sim, acho que sim... – Disse eu meio sem saber como colocar outras palavras. Então depois destes preliminares, ela se aproximou do lugar em que eu sentava e colocou sua mão direita sobre o meu joelho. Deixou-se ali por um tempo e depois retirou, talvez vendo meu meio constrangimento silencioso.
- Será que o senhor poderá nos ajudar, sinto que o meu marido está se acabando...Tenho medo até de que ele arrume outra esposa.
– Bom! Eu disse, pensando: se vocês me permitirem eu posso tentar.
- Na verdade, senhor Fernão, eu é que tenho que consentir, por que meu marido não terá cabeça para fazer isso, creio que ele esteja precisando de alguns dias de descanso, coisa que o senhor compreende de que sendo assim, teremos muito tempo para aprender, não é?
- Principalmente eu. Não é senhora? Arrisquei.
- Que isso senhor Fernão, deixe de falsa humildade... – Deu um risinho de canto de lábios, para apagar a feição vexada.

O tempo parecia voar para mim, por que temia a chegada de seu marido para o almoço e ele poderia pensar coisas indevidas a nosso respeito, já que ela estava tão próxima de mim, que tive impressão de ouvir seu sugar de ar.
E eu não via a hora de sair correndo, sem esquecer as ferramentas, é claro.
- E a televisão que estava com defeito? - Tentei falar com voz firme.
- Ah, sim! É aquela ali, ontem não quis funcionar de jeito nenhum...
- Me levantei e fui ligar o aparelho para ver o resultado, mas quando liguei, o aparelho funcionou normalmente. Demonstrando que não havia nada de errado com ele.
- Senhora! - Chamei-a - pois ela havia saído da sala e entrado no quarto.
- Sim, vou indo! - Respondeu-me de onde estava. Passados alguns minutos ela voltou e veio ter comigo, só que agora vestia outra roupa, muito mais informal e atraente, senti um certo frescor vindo dela como se me tivesse chegado uma fonte de água.
- Sua televisão não me parece com defeito!
- Ah... Não? Pois bem, sendo assim, poderemos começar agora mesmo com aquela ajuda que o senhor prometeu, o que acha? Disse e em seguida deu dois passos... Fui literalmente pego de surpresa!
 - Bem... Eu acho que... Bom não sei... Será que...gluss! hum!.. Bom... Não sei...


Fim.

O trabalho (Conto) - GERALDO, A MULHER E FERNÃO de ZéReys - poeta do profundo, foi licenciado com uma Licença Creative Commons - Atribuição - CompartilhaIgual 3.0 Não Adaptada. Com base no trabalho disponível em http://www.facebook.com/zedosreys.
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sexta-feira, 5 de outubro de 2012

ASAS DE ESTRELA


Agora viajo toda noite, solitariamente,
a cavalo em minha estrela perdida.
Sou um menino ingenuo,
com minhas imaginações expostas.

O vento dos astros curou minhas feridas.


E entre estas ruas e avenidas, 
são lindas as flores que me perpassam, 
nestes meus jardins flutuantes.

É tão bom - como era antes - quando te encontro
e te pego as mãos, e vens comigo por estes 
caminhos ambíguos, como se brincássemos de viver,
as nossas coisas nenhumas, tão importantes.

 - Que eram! 

E que agora assemelham-se a comprar um disco 
novo de Djavan, do qual sou fã - coisa de quando 
eramos - um - sem nunca ficarmos - zero a um -, 
antes que me restasse as estrelas...

ZéReys - poeta do profundo.

Correspóndência


O Dom Milagroso de um Grande Amor

Na vida de toda a gente há braçados floridos dessas tolices sem importância. Só a raros eleitos é dado o milagroso dom de um grande amor. Eu teria muita pena que o destino não me trouxesse esse grande amor que foi o meu grande sonho pela vida fora. Devo agradecer ao destino o favor de ter ouvido a minha voz. Pôr finalmente, no meu caminho, a linda alma nova, ardente e carinhosa que é todo o meu ampa­ro, toda a minha riqueza, toda a minha felicidade neste mundo. A morte pode vir quando quiser: trago as mãos cheias de rosas e o coração em festa: posso partir contente. 

Florbela Espanca, in "Correspondência (1930)"

O QUE DIZER...

O que dizer...

Desgastaram a melhor de nossa palavra,
reduziram-na às cinzas, sua alma.
Eu queria tanto te dizer "Amo-te" agora,
mas há uma infidelidade naquele
cadáver de sílabas que não compreendo.
Talvez devesse perceber
que seja eu que te profiro
e que te dou vida com minha verdade.
Mas tenho medo de tua infiel conotação atual,
E diante desta incompreensão mútua,
entre eu e ela, tão igual, na dúvida cruel,
perco-me a dizê-la em silêncio
para os teus olhos...
Amo-te de verdade...

ZéReys - poeta do profundo.